Festa de São Tiago
Considerada uma das mais belas festividades folclóricas do Amapá, a Festa de São Tiago é uma histórica tradição secular, realizada em Mazagão Velho.
Situado a 36 km da sede do município de Mazagão Novo, localizado às margens do rio Mutuacá, a Vila de Mazagão Velho foi fundada em 1770 com a intenção de abrigar 163 famílias de colonos lusos oriundos da costa africana, em decorrência dos conflitos políticos-religiosos gerados entre portugueses e muçulmanos que ainda por lá perduravam.
Em 1771, diversas famílias acompanhadas de seus escravos aqui aportaram. A partir de 1777, em homenagem ao glorioso São Tiago, até o presente revivem as batalhas em que cristãos e muçulmanos degladiaram-se no continente africano.
O aspecto místico da festa remonta ao fato e ao credo popular e secular do aparecimento inesperado de São Tiago, o valente soldado anônimo que conduziu os cristãos em valente, heróica e vitoriosa batalha, que parecia não ter mais fim.
A guerra entre fervorosos cristãos lusitanos e muçulmanos teve sua origem após a tentativa dos cristãos de tentar converter os muçulmanos a fé cristã, ao batismo e ao rito católico.
A intervenção político-religiosa dos cristãos imediatamente provocou a ira e a reação dos seguidores de Maomé, que mais tarde declararam guerra total aos mesmos, liderados pelos capitães Atalaia, Jorge e Tiago.
Dias seguidos, batalhas sangrentas tiveram lugar em solo afro, com certa vantagem para os portugueses que se aquartelaram heroicamente, resistindo aos constantes ataques mouros.
Chefiados pelo rei Caldeira, vendo que não conseguiam vencer os fervorosos cristãos, os mouros planejaram armar uma cilada. Pediram trégua e, após mensagens, solicitaram o fim da guerra. Depois resolveram encaminhar diversos presentes e iguarias aos capitães cristãos.
Os cristãos receberam com grande espanto e desconfiança os presentes e as iguarias, desconfiados que os pratos típicos pudessem estar envenenados. Após reunião do conselho de guerra, os oficiais cristãos resolveram na calada da noite mandar alguns jovens soldados disfarçados de camponeses jogar boa parte da comida na granja dos mouros, onde ficavam os animais, e guardaram a outra parte a fim de preparar uma boa surpresa, virando o feitiço conta o feiticeiro.
Sem esperar a desconfiança e o "troco" dos cristãos, os mouros resolveram oferecer, em nome da "paz aparente", um baile de máscaras, discretamente estendendo o convite aos cristãos que quisessem passar para seu lado, regalias e luxúria, sem que pudessem ser vistos e reconhecidos por seus superiores.
Alguns soldados e oficiais cristãos compareceram à festa mascarados, e levaram a outra parte da comida, distribuindo-a aos mouros que dançavam, bebiam, gritavam e comiam em demasia.
Ao amanhecer o dia, algumas autoridades mouras que sempre visitavam a granja diariamente imediatamente notaram os animais mortos. Notaram também os restos de comida oferecido aos cristãos. Imediatamente deram o alerta e chamaram os soldados, sendo que muitos já estavam mortos, vítimas de sua própria comida envenenada. E o que era pior, entre os diversos mortos, estava o gordo, fanfarrão e perverso Rei Caldeira, inerte em seu trono, também vítima de sua própria trama.
O menino Caldeirinha, filho do Rei Caldeira, assume imediatamente o trono e dá ordem imediata de ataque e vingança contra os cristãos.
Ocorre que, bem antes, aproveitando o desespero e a desorganização dos mouros, os cristãos desferem ataque rápido e inesperado contra seus inimigos. Antes do ataque se confessam com Deus e preparam-se espiritualmente, proferindo juramento solene.
A fúria dos mouros somada a valentia e coragem dos cristãos gerou uma batalha sangrenta, somente amenizada ao meio-dia. Neste horário, aproveitando o breve descanso de seus inimigos, os mouros encaminham um Bobo Velho espião para tentar convencer alguns desertores convertidos ao cristianismo, a peso de ouro e jóias, a retornarem ao acampamento mouro para derrotar o inimigo invasor. Mais que isso, o Bobo Velho tinham também como missão observar a moral da capacidade de luta dos cristãos, seu efetivo, armas disponíveis, munição e canhões, etc.
Percebendo imediatamente que o Bobo Velho era mais uma "armação" do inimigo, deixaram que o dito cujo se aproximasse do acampamento.
Quando chegou perto, o mesmo foi apredejado, correndo assustado em disparada.
No final da tarde, antes de reiniciar novamente a batalha, o capitão cristão Atalaia resolve espionar a situação e o movimento mouro.
Tendo sido descoberto e alvejado à bala, rouba a bandeira do acampamento inimigo. Ferido de morte, Atalaia consegue chegar perto de seu acampamento e atirar a bandeira inimiga a seus companheiros, dando gritos de alerta. Lamentavelmente, diz a lenda, os mouros conseguem capturá-lo para depois decepar a sua cabeça, impiedosamente. Espetam sua cabeça em uma vara e colocam-na propositalmente próximo ao muro do acampamento cristão, para gerar pânico e terror.
Ainda como vingança e sinistro plano do rei Caldeirinha, soldados mouros fazem uma passeata ao redor do acampamento cristão, conseguindo atrair a atenção de diversas crianças que estavam brincando no pasto, insensivelmente raptadas pelos cruéis soldados. Depois do vil sucesso do rapto, as inocentes crianças são vendidas no mercado negro. O dinheiro foi empregado para compra de mais armas e munições.
Com grande pesar e dor, dando falta de suas crianças, revoltados, os cristãos iniciam violenta batalha contra o inimigo, diz a lenda, cheia de atos de heroísmo, coragem, valentia e fé.
Assustado, o rei Caldeirinha propõe a troca do corpo de Atalaia pela bandeira moura em poder dos cristãos. Estes aceitaram a troca. Na hora receberam o corpo mas não entregaram a bandeira.
Mais uma vez a batalha recomeçou de forma ainda mais violenta. Ao anoitecer, os cristãos pediram a Deus e ao Divino Mestre Jesus que prolongasse o dia a fim de que pudessem vencer tão desesperada luta.
Dessa forma, conta a lenda, os cristãos sentiram que o dia estava se prolongando e a batalha sendo vencida, o que após mais luta, finalmente o jovem rei Caldeirinha foi aprisionado, enquanto que vários soldados mouros optaram pela fuga.
Mortos muitos infiéis mouros, os cristãos finalmente puderam comemorar a vitória agradecendo a Deus e ao Santo Cristo pela vitória tão esperada. Em passeata, levaram o rei mouro vencido, poupando, como cristãos e em homenagem ao Criador, a sua vida.
Vários oficiais e soldados procuraram saber quem era o valente soldado que tinha abatido inúmeros inimigos na última e mais sangrenta batalha, sem conseguir encontrá-lo. Finaliza a lenda afirmando que a mitológica figura de São Tiago aparecia vez por outra no campo de batalha com uma armadura brilhante, intocável e invulnerável, guiando os soldados cristãos e causando baixas profundas, medo e pânico no inimigo, a moeda de troca do Plano Superior contra as atrocidades praticadas pelos mouros, na época.
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